Por: Antonio Carlos de Oliveira
01/10/2019
12:00

Quando escrevemos sobre determinado tema, temos a tendência de repetir várias (ou muitas) vezes determinada palavra. Parece que ela fica encalacrada na cabeça. Nesses casos, então, precisamos usar sinônimos e evitar a repetição a qual traduz pobreza de linguagem.

Mário Prata, famoso cronista, em uma crônica do seu livro “100 Crônicas Escolhidas”, escrevendo sobre o joelho, repete dezoito vezes a palavra joelho, joelho, joelho. Quando acabou de escrever suas peripécias, talvez tenha caído de joelhos e pedido perdão pelo seu pecado. Ou tenha entrado num restaurante típico e pedido joelho de porco. E como poderia ter evitado o exagero? Ora, poderia ter empregado “ele”, “o referido”, “esta parte da perna”, “este local do corpo”,  “a tal articulação” e por aí vamos.

Às vezes, aquele que escreve está obcecado pelo tema e não percebe a repetição da palavra. O escrito precisa ser lido muitas vezes e, de preferência, no mínimo, dois dias depois. Aí, o escritor, o jornalista, o cronista (ou seja lá quem for) não estará mais sob o efeito enganador da febre da inspiração. Ele vai ler o texto de um modo frio, racional e procurando burilar, isto é, melhorar o seu trabalho. Nessas alturas, ele vai notar que a sua criação não é lá tão brilhante como lhe havia parecido. Algumas palavras precisam ser trocadas, certas frases não estão soando bem, aparece muitas vezes a palavrinha “que” e há a repetição de algum termo ou de alguns. É bom frisar também: o texto pede, com insistência, correção, clareza e, se possível, concisão. Isto é óbvio, mas há muitos que estão no ofício de escrever e se esquecem desta obviedade.

Lendo jornais e revistas, encontramos, às vezes, alguns senões os quais depõem contra a qualidade do emissor da mensagem. São gírias, palavras vulgares e o emprego adoidado de termos da língua inglesa. Os erros de português, porém, são raros. A concisão e a clareza são duas qualidades merecedoras de uma melhor atenção por parte do pessoal da imprensa. Há textos prolixos e por causa disto pecam pela falta daquelas duas qualidades. O leitor fica perdido no emaranhado, no cipoal de vocábulos arrevesados, de períodos longos e da repetição da mesma ideia. Uma coisa é escrever de modo sintético e outra, completamente diversa, é escrever com o intuito de ser difícil. José Saramago, por exemplo, é prolixo, usa períodos longos, mas tem uma classe e uma originalidade ao escrever que deixa o leitor encantado diante do seu trabalho. Graciliano Ramos, ao contrário, escreve períodos curtos, seu estilo é simples e conciso e encanta igualmente o leitor. O encantamento na obra do mestre alagoano consiste no seguinte: com palavras simples e períodos curtos, ele consegue transmitir ao leitor os profundos labirintos da alma humana.

Façamos aqui uma rápida e despretensiosa comparação entre Dostoiewiski e o romancista Graciliano. O escritor russo desvenda os recônditos da alma, usando a prolixidade com requinte de arte. O alagoano faz a mesma coisa, usando a síntese com requintes de arte. Mais enxuto, menos dramático e mais irônico, Graciliano Ramos poderia ser chamado de Dostoiewiski tropical.

Nota da redação: Antonio Carlos de Oliveira é membro da Academia Amparense de Letras

 


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